Alvos de críticas dos dois lados do espectro ideológico, os meios de comunicação ditos tradicionais continuam tendo um papel central na política contemporânea.
A conclusão é de um novo livro lançado pela Plataforma Democrática, parceria entre a Fundação Instituto Fernando Henrique Cardoso e o Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, "Ativismo Político em Tempos de Internet". A edição digital pode ser baixada gratuitamente no site da Plataforma Democrática.
A obra, organizado pelos sociólogos Bernardo Sorj e Sergio Fausto, reúne 19 estudos de caso de seis países da América Latina em que a ação política de alguma forma foi apoiada mais em cliques do que claques.
Do Brasil foram abordadas as manifestações de 2013, o surgimento da Mídia Ninja, o processo de construção do Marco Civil da Internet e a rede de petições on-line Avaaz.
Segundo os organizadores, a relação entre a imprensa e os novos movimentos políticos é ao mesmo tempo conflitiva e de apropriação, mas a mídia profissional continua exercendo forte influência.
"Os estudos de caso mostram que os ciberativistas esforçam-se para que suas causas encontrem eco nos meios tradicionais de comunicação, embora muitos deles sejam às vezes extremamente críticos em relação à imprensa comercial. De certa forma, os meios tradicionais mantêm a capacidade de legitimar (ou não) as informações que circulam pelas redes sociais e/ou as mobilizações sociais por elas desencadeadas."
Esse papel, de acordo com o livro, é explicado pela imprensa continuar sendo vista por boa parte da população como a fonte mais confiável de informação. Também pesa que, apesar do amplo alcance da internet, ela chega a um público ainda limitado.
As conclusões estão alinhadas a outras pesquisas que monitoraram as redes sociais durante as manifestações de 2013 e nas eleições de 2014 também já apontaram o protagonismo do jornalismo profissional.
FACEBOOK

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Outra das constatações do livro é a de que, na disputa política atual, o Facebook se tornou inescapável. Nos Estados Unidos, onde 60% dos adultos dizem se informar por meio da rede social, a empresa vem passando por escrutínio inédito após surgirem suspeitas de que o conteúdo que aparece para os usuários não é determinado apenas pela frieza dos algoritmos. A suspeita é que haja um viés de esquerda na lista de assuntos mais lidos devido à manipulação dos resultados por funcionários de Mark Zuckerberg.
Alvo de investigação no Senado americano, a companhia nega as acusações de parcialidade e anunciou mudanças para tentar aumentar a pluralidade de fontes de informação destacadas na em sua plataforma.
No Brasil, novos dados sugerem que a penetração da rede é ainda maior do que em seu país de origem. Pesquisa Datafolha feita em abril apontou que 95% dos brasileiros que têm smartphone usam o Facebook e 89% deles o fazem para consumo de notícias, principalmente de política.
Os casos brasileiros abordados no livro demonstram que a rede, mesmo amplamente criticada por ativistas, já possui papel central na articulação política."Apesar de notarmos que cada um dos agrupamentos analisados fez um uso específico desse site de rede social, pode-se afirmar que o Facebook foi o principal canal para divulgar causas e mobilizar pessoas durante o Marco Civil, os protestos de junho e segue sendo para as campanhas da Avaaz", afirmam Rodrigo Savazoni e Kalinca Copello, autores do capítulo brasileiro.
Eles ponderam, entretanto, que o formato da rede dificulta a troca de pontos de vista distintos por apresentar mais notícias que refletem aquilo que o usuário já concorda. Esse "filter bubble" (bolha do filtro), afirmam, ficou evidente nas eleições de 2014.
"O fato é que fora das redes sociais, hoje, não há salvação", afirmou Bernardo Sorj no lançamento da obra.
ON-LINE/OFF-LINE

Segundo Sorj, a principal inovação do livro é analisar essa convergência entre o mundo on-line e off-line, marcada "de uma forma que já não é possível demarcar onde essas duas dimensões começam e terminam".
Um dos propósitos do livro é tentar entender se uma nova geração de "indignados" que usam a internet para difundir suas ideias pode ser encarada como uma nova forma de ativismo ou se isso não passa de um clique-ativismo, ou "ativismo de sofá", sem maiores consequências no mundo real.
Para os organizadores, existe "uma distinção por vezes tênue, mas real e, em determinados momentos, decisiva, entre o ato de clicar e o de estar presente nas ruas, entre ser um simples usuário e possuir recursos materiais para investir na programação e produção de conteúdo em grande escala, entre o poder de enviar mensagens e o de dispor de meios legais e repressivos para interferir".
Segundo os autores, a modulação desses dois campos é influenciada pela predominância de duas visões opostas sobre a internet: uma, "otimista", comemora a maior possibilidade de debate e participação democrática; outra, "pessimista", vê na cacofonia das redes uma deterioração do debate público e um menor engajamento real.
Os pesquisadores acreditam haver um pouco dos dois cenários. Mas, mesmo considerando as novas possibilidades abertas com a internet, especialmente para o público mais jovem, os estudos de caso revelaram mais elementos da visão "pessimista".
"A expectativa de que o mundo online constituísse um espaço no qual cidadãos empoderados pela possibilidade de acessar diretamente o espaço público e se comunicar em redes horizontais estariam mais motivados a participar não se confirma. Certamente, em momentos de 'explosão social', eventos que mobilizam toda a sociedade, a comunicação online direta, horizontal e de massa alcança um público amplo e produz efeitos políticos importantes. Mas, em geral, a comunicação política continua sendo um tema de interesse de uma minoria."
Essa visão "pessimista" aparece também em relação às redes sociais. Para os organizadores, elas "são extremamente eficazes no que se refere ao envio de mensagens claras e simples em momentos de mobilização ou quando se trata de temas pontuais que supõem uma resposta binária. Mas, até o momento, não se conseguiu desenvolver plataformas que permitam a deliberação por parte de um grande número de participantes sobre temas complexos, que exigem esforços de negociação e de síntese".
ATIVISMO POLÍTICO EM TEMPOS DE INTERNET
ORGANIZADORES: Bernardo Sorj e Sergio Fausto
EDITORA: Edições Plataforma Democrática
QUANTO: Grátis (403 págs.)